Formação pedagógica e interculturalidade no trabalho com os Háliti-Paresi

Os professores indígenas das aldeias Háliti-Paresi, de Campo Novo do Parecis (MT) com a formadora Daniele Pires Dias.

Imagine só os desafios educacionais de um país de dimensões continentais, com características físicas únicas, pessoas e saberes riquíssimos. Um caldeirão cultural cheio de vida, fantástico e desafiador. Como oferecer educação de qualidade, respeitando, valorizando e, especialmente, aprendendo com essas características?

Ao longo dos anos, esse tem sido um dos grandes desafios – e uma das grandes alegrias – da equipe pedagógica da Editora Opet. Que, recentemente, teve uma oportunidade fantástica de avançar ainda mais nesse aprofundamento intercultural.

Foi a partir de um trabalho proveitoso com os docentes de Campo Novo do Parecis, município parceiro da Editora Opet no oeste do Estado de Mato Grosso. Um trabalho que envolveu, também, professores indígenas da etnia Háliti-Paresi, donos de uma cultura poderosa!

Os Háliti-Paresi estabeleceram contato com os colonizadores portugueses há, pelo menos, trezentos anos e, desde então, trabalham incansavelmente para preservar e transmitir seus valores culturais, visão de mundo e idioma – que pertence à família Aruak – em uma região que é, hoje, uma das principais fronteiras agrícolas do país. E têm tido sucesso nisso!

A formação – Em Campo Novo do Parecis, nos dias 07 e 08 de abril, aconteceu a formação de implantação da Coleção Entrelinhas para Você, que passou a ser utilizada pelos professores e pelas crianças da Educação Infantil 4 e 5 (quatro e cinco anos).

Participaram da formação todos os professores desse nível de ensino, entre eles os 11 docentes de três escolas indígenas: da Escola Indígena Sacoré Kase Weteko – das aldeias Morrinho, Otyhaliti, Bacaiuval e Sace II –, da Escola Municipal de Educação Indígena Seringal – aldeias Chapada Azul, Seringal e Quatro Cachoeiras – e da Escola Municipal Indígena Bacaval – aldeias Bacaval e Wazare.

“São professores de uma comunidade extremamente importante na região”, conta a professora Daniele Pires Dias, responsável pela formação em Campo Novo do Parecis. “Ao todo, são 79 aldeias Háliti-Paresi, das quais nove são atendidas dentro da parceria com a Editora”, explica.

Em Campo Novo do Parecis, o trabalho tem a supervisão regional da professora Danuza Peracetta. “Como formadores, aprendemos sempre com os docentes”, observa Danuza. 

No caso de Campo Novo do Parecis, esse aprendizado é ainda mais especial, uma vez que nos conectamos a uma cultura ao tão rica, tão original e tão brasileira. Só temos a agradecer! Nos colocamos à disposição do município para que, juntos, possamos avançar ainda mais na educação de toda a comunidade.”

Valdirene Avelino Zakenaezokero (foto) é professora na Escola Municipal Indígena Wazare, na aldeia Wazare, e líder em sua comunidade. Ela ficou satisfeita com a implantação dos materiais e com a troca cultural durante a formação.

“Eu vejo como um trabalho muito proveitoso para ambos os lados. Nós ficamos felizes em fazer parte desse processo de implantação dos materiais didáticos da Educação Infantil. E ficamos muito satisfeitos com a atenção dada pela professora Daniele. Foi uma verdadeira troca de conhecimentos”, avalia.

Valdirene considera importante a chegada da Coleção Entrelinhas para Você às escolas das aldeias. “Vamos ter um conteúdo adequado, de qualidade, para a nossa Educação Infantil, e também poderemos acrescentar elementos da nossa própria cultura ao trabalho”, explica.

Ela destaca a presença do ensino bilíngue em todas as escolas indígenas, que cumpre um papel importante no processo intercultural. As aldeias, aliás, dispõem de materiais didáticos próprios, escrito em Aruak, de alta qualidade.

Interculturalidade: livro didático produzido pelos indígenas Háliti-Paresi com conteúdos bilingues.

“Nós trabalhamos com nosso próprio livro, em nosso idioma, e também com materiais em português, para que os jovens tenham pleno domínio da língua quando forem estudar na cidade. Nesse contexto, a integração com os materiais da Editora Opet é muito tranquila.”

Os materiais da Coleção Entrelinhas para Você contemplam brincadeiras indígenas, de etnias como a dos Xavantes e de outros grupos. “Fico feliz em ver essas brincadeiras nos livros. Meu desejo é que, cada vez mais, conteúdos ligados à interculturalidade e às culturas indígenas estejam nos livros. São muitas as possibilidades de trabalho com todas as crianças”, avalia Valdirene.

Crianças com a professora Valdirene. Valorização e afirmação da cultura são uma parte fundamental da educação nas comunidades Háliti-Paresi.

Intercultural – Daniele explica que essa não foi a primeira vez que a Editora trabalhou com a formação de professores indígenas. “A presença indígena é muito importante em todas as regiões do país. Assim, já trabalhamos com professores indígenas anteriormente. Contudo, foi o primeiro trabalho específico com os Háliti-Paresi, que têm uma presença cultural e demográfica poderosa nessa região do Mato Grosso.”

O trabalho formativo, como observado anteriormente, envolveu os professores das escolas indígenas, urbanas e rurais do município, com foco nos elementos e nas possibilidades de trabalho da Coleção Entrelinhas para Você. “Como as escolas indígenas também começaram a utilizar os materiais didáticos, foi importante ter os professores conosco, inclusive para o diálogo e para a construção conjunta do uso dos recursos e do conhecimento”, observa Daniele.

Crianças na escola: a formação escolar bilíngue fortalece e promove os valores culturais indígenas, com foco na interculturalidade.

Vale salientar que, no caso dos povos Háliti-Paresi, a identidade cultural é um elemento poderoso. No contexto escolar, que é bilíngue (paresi-português), ela é trabalhada em todo o processo de alfabetização, o que ajuda a fortalecer e a expandir a cultura para as próximas gerações.

Assim, como foi trabalhar com a Coleção Entrelinhas para Você? “Trabalhamos, evidentemente, com todo o respeito, pedindo licença para entrar em seu contexto e dialogar, mas dentro de um universo mais amplo. Estávamos, enfim, entre professores”, conta Daniele.

“No caso das escolas indígenas, os materiais poderão ajudar os docentes a organizar o cotidiano das crianças, como acontece em todas as escolas onde a coleção é utilizada. Sendo oferecida em português e em contato com materiais próprios desenvolvidos pelos próprios Háliti-Paresi, a coleção, com certeza, também vai colaborar para um processo de interculturalidade”, avalia.

Ampliar o olhar – Maria Edilene Mateus do Nascimento (foto) é diretora pedagógica da Educação Infantil Secretaria Municipal de Educação de Campo Novo do Parecis.

Ela acompanhou o trabalho de implantação dos materiais com os professores e se disse satisfeita com a parceria.

“A formação foi muito enriquecedora e atendeu as expectativas dos nossos professores e gestores”, avalia. “Pudemos ampliar o olhar em relação às possibilidades de inovação e à apropriação dos materiais pelos professores”.

Ela destaca a importância dos materiais Sefe no processo de interculturalidade na educação indígena na rede municipal. “A utilização dos livros vai permitir um universo de conhecimento, integração e vivências de diferentes culturas. Estamos felizes com a possibilidade de realizar um trabalho integrador e norteador para a educação infantil indígena, e garantir que lhes sejam assegurados os direitos de aprendizagens com devido respeito e valor à cultura dos povos indígenas.”

Segundo Edilene, a integração dos materiais e ferramentas é possível e necessária. “Desde a pré-escola, os indígenas devem estar integrados e convivendo com a língua portuguesa, relacionando esses conhecimentos com a língua materna, buscando as habilidades necessárias para consolidar o processo de alfabetização e letramento. Primamos pela identidade, os saberes, o respeito e os direitos dos povos indígenas, reconhecendo e assegurando sua diversidade.”